quarta-feira, 7 de outubro de 2009

Vergonha de ser honesto

Impressionante como os valores mudam freneticamente numa sociedade, a ponto de se ter vergonha da sua própria honestidade.

Semanas atrás um vizinho veio bater à minha porta e, timidamente, informar que sabia que eu assinava o velox. Continuou dizendo que um outro vizinho - que também tinha velox - iria se mudar, o que deixaria o restante dos moradores "órfãos de internet". Explico: todos eles "compartilhavam" a internet daquele que estava de mudança, seguindo aquele "sistema" tão comum nas classes mais miseráveis denominado popularmente de "gato".

Com a mudança desse morador, o que meu vizinho intencionava era que eu disponibilizasse a minha internet para os demais moradores que, em contrapartida, me pagariam uma determinada quantia mensal pelo uso do mesmo.

Embora meu sentimento fosse de indignação com a famigerada proposta, envergonhei-me pela negativa da minha resposta e me imbuí das mais inconvincentes desculpas para sustentar o meu nem tão sonoro "não".

O básico, o mínimo de valor, é tão incomum hoje em dia que, para não nos indispormos com toda a humanidade ao nosso redor, temos que esconder a honestidade e mascará-la em nome de uma boa convivência social. Como já dizia Rui Barbosa, "de tanto ver triunfar as nulidades, de tanto ver prosperar a desonra, de tanto ver crescer a injustiça, de tanto ver agigantarem-se os poderes nas mãos dos mais, o homem chega a desanimar-se da virtude, a rir-se da desonra, a ter vergonha de ser honesto".

domingo, 2 de agosto de 2009

As preripércias do Incrível Hulk Parte V - O susto

O dia do amigo se passou com uma crença inabalável advinda da ameaça da perda: definitivamente tenho no meu cão, meu melhor e mais fiel amigo.

Embora eu tenha sido apresentada à realidade da vida canina antes mesmo de ser expulsa do aconchego da barriga materna, não foi menos desesperador imaginar meu "negao desengonçado" se esvair antecipadamente ao seu "prazo de validade" regular.

Uma suposta doença que lhe tiraria a vida não ficou em meras suposições ao tirar-me o encanto da mesma. Pouco a pouco era eu que definhava em lágrimas desconcertantes ao lembrar da importância que meu anjinho de quatro patas com um rabinho movido a pilha duracell representou no período em que eu mais estaria só caso esse serzinho despretensiosamente terapêutico não existisse.

Talvez seja difícil para aqueles que não possuem um desses anjinhos como constante companheiro compreender, mas os cães nos alimentam de um amor o qual muito provavelmente nós não somos capazes de retribuir na mesma proporção. Deve ter sido deles a origem da palavra "incondicional", "altruísmo" e até mesmo - por que não - "filantropia".

Hulk é, sem sombra de qualquer dúvida, um desses anjinhos e é, ainda, o dono dos olhos mais expressivamente apaixonados e levados que eu conheço. Um cão absolutamente perfeito dentro da minha imperfeição. Acolhedor e por vezes (talvez muitas) irritante. Brincalhão, bem disposto, hiperativo, inteligente, extremamente dengoso. Carinhoso, dependente, carente e, como eu, amante das águas! Com ele não se pode vivenciar a solidão que, por vezes, para nós aparece quando estamos lá, em meio a tanta gente - já dizia Mafalda.

Por isso é que vê-lo diante de mim sem o vigor que lhe era peculiar e vislumbrar a hipótese de que sua vida não continuaria dentro do seu curso normal, mas, sim, lhe seria arrancada pouco depois do seu primeiro ano completo, foi como um solavanco no meu pulmão.

Mas eis que o susto se resumiu a um comentário infeliz e precipitado do veterinári, que não foi capaz de prever o impacto de sua prévia sentença. Por sorte, na tempestividade do recurso, o acórdão prolatado conferiu ao meu anjinho a possibilidade de cura e o direito a peraltices vitalícias.